Alimento presente na culinária de todas as regiões do Brasil, a mandioca tem sido cada vez mais utilizada na alta gastronomia brasileira. É o que constata a chef paraense Daniela Martins, proprietária do restaurante Lá em Casa, de Belém (PA). O uso da mandioca pelos chefs de cozinha tem aumentado consideravelmente, não só na forma de tapioca, mas também como farinhas e tucupi, que começaram a sair do Pará para restaurantes requintados em todo o Brasil. “Como chefs de cozinha, temos sempre de procurar novidades, e os produtos da Amazônia, onde a base da alimentação é a mandioca, são a grande descoberta da atualidade”, conta.
Daniela diz que, além das receitas tradicionais, começam a surgir novas descobertas, como o tucupi preto. “Trata-se de uma redução ao extremo do tucupi amarelo, feita por índios ou descendentes. Esse era um produto que estava sendo perdido”, conta a chef, que, com o auxílio da mãe e da irmã, pesquisa novos alimentos na região norte do país.
O restaurante Lá em Casa tem sido, ao longo dos últimos 45 anos, um grande laboratório para o preparo e a divulgação da comida tipicamente regional do Pará. Inspirado na culinária da avó de Daniela, Anna Maria Martins, ele oferece pratos com quase tudo o que vem da mandioca: maniva, beiju, tapioca, tucupi, farinhas, tucupi preto. “Só não usamos a casca, mas, se descobrirmos um uso para ela, passaremos a usar”, conta Daniela, que seguiu os passos do pai, Paulo Martins, chef de renome internacional. Entre os pratos com tapioca do restaurante, destacam-se o tacacá, que leva goma de tapioca, e o camarão empanado com farinha de tapioca.
Além da tapioca, já consumida em todas as regiões brasileiras, o tucupi (sumo amarelo extraído da raiz da mandioca) é outra iguaria paraense que vem sendo usada com mais frequência na alta gastronomia brasileira. “Existem formas interessantes que estão sendo usadas por outros chefs, que suavizam o sabor do tucupi, para que ele não fique muito agressivo ao paladar de quem não está acostumado, mas que mantêm as características do produto”, diz Daniela.
Ela acredita que a maniva (folha da mandioca), usada na produção do prato típico conhecido como maniçoba, feito com maniva moída e cozida, acrescida de carnes de suínos e bovinos, também deve ganhar novos usos pelas mãos de chefs de outras regiões do país.
O exemplo mais marcante é a tapioca, produzida a partir da fécula de mandioca, que já caiu no gosto do brasileiro. De acordo com dados da Associação Brasileira dos Produtores de Amido de Mandioca (Abam), nos últimos cinco anos a produção triplicou, reflexo da popularização dessa iguaria nordestina, que ganhou adeptos em todas as regiões brasileiras.
“Assim como aconteceu com o pão de queijo, feito com fécula e polvilho azedo de mandioca, que ultrapassou as fronteiras de Minas Gerais e ganhou o mundo, a tapioca começa a ser difundida fora do país”, conta José Eduardo Pasquini, vice-presidente da Abam.
Dados da Abam mostram que o consumo das indústrias que fabricam amido é de 4 milhões de toneladas de mandioca por ano, volume que rende 750.000 toneladas de amido. Deste total, 150.000 toneladas são destinadas à produção de tapioca, que respondia por 50.000 toneladas em 2012. “Atualmente, existem mais de 300 marcas de tapioca no Brasil, uma quantidade impensável anos atrás”, diz José Eduardo. São indústrias regionais que apostam na consolidação do consumo nos próximos anos. Só no Paraná, um dos maiores Estados produtores de mandioca, com safra estimada entre 3 milhões e 3,8 milhões de toneladas por ano, já existem 45 indústrias produzindo diversas marcas de tapioca.
A fabricação da tapioca é o quarto segmento que mais utiliza a fécula de mandioca industrial, setor que, no ano passado, teve um crescimento de 35% no faturamento, estimado em R$ 1,3 bilhão pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP). A indústria de massa, biscoito e panificação é a que mais demanda a fécula, vindo em seguida as vendas no mercado atacadista e depois o uso pelos frigoríficos para a fabricação de embutidos.
Fábio Isaías Felipe, pesquisador do Cepea, acredita que a tendência é de crescimento do consumo de produtos elaborados a partir da mandioca nos grandes centros, graças ao valor cultural gastronômico e à funcionalidade do alimento, por não conter glúten e ser livre de organismos geneticamente modificados (OGM). “É um produto genuinamente brasileiro, o mais brasileiro dos alimentos”, diz ele.
Por: Luciana Franco e Venilson Ferreira
Fonte: Globo Rural
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